Ela diz ter ficado feliz com a decisão judicial porque a mudança dos documentos lhe trará menos problemas e constrangimentos. “Eu gostei bastante. Foi muito interessante porque não vai dar aquela correria quando eu chego no postinho [de saúde]. Minha mãe chega lá e ela tem que falar que esqueceu a identidade e que eu sou transexual”, lembra.
A menina diz que prefere que as amigas mais próximas não descubram sua condição, pois tem receio do que pode acontecer com as amizades. “Tenho medo de quando elas descobrirem. Eu tenho medo de que elas não queiram mais serem minhas amigas”, afirma.
Em entrevista ao Jornal Nacional, a psicóloga Cristiane Isabel Guerra, que acompanhou o caso desde o começo, explica que a mudança e o trabalho em relação à adequação da criança ao gênero ao qual ela pertence, não foi feita de maneira precipitada.
“Não é cedo demais porque não foi algo que aconteceu da noite para o dia. Foram feitos estudos e acompanhamentos. Foi avaliado o desconforto e o constrangimento que ela passava em algumas situações. Talvez com outra criança acontecesse em outro momento. Mas com ela aconteceu no momento necessário”, defende.
Cristiane ainda aponta que existe uma confusão sobre o conceito de transexualidade entre o público em geral. “São três questões, na verdade. Existe o conceito de sexo, que é como você nasce e é a biologia que te dá. Você tem sua orientação, que é ligada ao afeto e à atração que você tem por outras pessoas. E existe o transexual que é o sujeito que tem um gênero que não corresponde ao seu sexo biológico”, afirma.
Caso
A mãe da menina, que pediu para não ter a identidade divulgada, conta que desde pequena a criança apresentava comportamentos que não correspondem ao gênero em que nasceu.
“Desde bem pequena, ela tinha gestos femininos, apontava para objetos cor de rosa na TV, tirava o tênis do pé na escola para calçar as sandálias das colegas. Não aceitava vestir roupa de menino. Tirava o short e ficava de camiseta para ficar parecida com um vestido”, conta.
Em uma das situações mais complicadas, a mãe conta que a criança já tentou cortar o pênis com uma tesoura. “Ela saiu do banho, passou perto de uma máquina de costura e pegou uma tesoura. [Ela] sentou e falou que queria cortar o 'piu piu' porque queria ser menina”, relata.
A menina deve ser submetida a uma cirurgia para a troca de sexo quando completar 18 anos. E, com a decisão judicial que permite a troca do nome e gênero nos documentos de identidade da criança, para a família, a cirurgia será a única mudança necessária para, de fato, o menino se tornar menina.